José Simplício


Ramira Cabral, anos 60. Na vilinha dos “Scarcelli”, cinco famílias vivendo uma pacata vida interiorana. Em frente da minha casa, moravam Dona Zélia, Guaraci, Inara, Moacir e “Lopicho”. Ainda aprendendo a falar, era assim que eu chamava o professor José Simplício. Para um garoto de poucos anos, balbuciar Simplício não era simples. Imagina, então, entender o que aquele homem fazia para agitar nossa cidade. Eu não tinha a mínima noção!

Passaram os anos. 1977. Somente na sétima série do ginásio viemos a nos reencontrar, agora como aluno e mestre. Ele, com seu bom humor habitual, num misto de carinho e molecagem, me chamava de “seu Lopicho”. Após várias “chamadas orais”, muitas gargalhadas.

Agora, ao comemorarmos seus 93 anos, apesar de sua partida há mais de 20 anos, percebo que ele está sempre presente na memória de muita gente. “Um inesquecível professor de vanguarda”, dizem seus alunos. “Que saudade faz o Zeca! ”, relembram seus colegas de profissão. “O pai da cultura jacareiense”, o rotulam seus amigos. Professor e negro: não há como não o associar ao personagem Mark Thackeray, interpretado por Sidney Poitier em “To Sir, Whit Love”. Desta forma, “Ao Mestre, Com Carinho” dedico esta pequena biografia.

“Carioca da Gema”, José Simplício nasceu em 27 de novembro de 1928, filho do seu Manoel e da dona Isabel Claudina. Ainda garoto iniciou seus estudos no Colégio Nilo Peçanha, concluindo o Ginasial e Científico no Colégio Rabelo. Posteriormente, licenciou-se em História e Geografia na Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil. Plenamente habilitado, deixou o Rio de Janeiro e passou a dar aulas em escolas públicas em Itu e Tanabi, sendo depois designado para a direção do Ginásio em Nhandeara, todas no Estado de São Paulo. Chegou em Jacareí no início da década de 1960, professor efetivo do CENE – Silva Prado até 1983, quando se aposentou.

Andou por outras cidades do Vale: em Taubaté, foi professor na UNITAU, além de Chefe de seu Departamento de Ciências Sociais e Letras. Em São José dos Campos, professor de História da América e História do Brasil na Faculdade Filosofia. Além disso, foi membro da Associação Interamericana de Imprensa e do Instituto de Estudos Valeparaibanos (USP), ministrando palestras e conferências sobre estudos afro-brasileiros. Em suas andanças, foi agraciado com as comendas de Honra ao Mérito Anna Néri e Barão de Taquari pela Sociedade Brasileira de Educação e Integração.

Comendador José Simplício

Em Jacareí, afora as salas de aula, entregou-se à efervescência cultural dos anos 60, dirigindo o Grupo Teatral TEJA – Teatro Estudantil Jacareiense Amador, recheado de peças nacionais e outras voltadas ao público infantil, como “Morte e Vida Severina” e “Pluft, o fantasminha”. Folião, colaborava no levantamento histórico para os enredos das Escolas de Samba. Participou, ainda, como organizador e colaborador do FEMPO – Festival Estudantil de Música e Poesia, sempre procurando destacar o aspecto da cidadania e o respeito às diferenças individuais. Aliás, por falar nisso, cadê o FEMPO, incorporado por Lei ao Calendário Oficial Cultural de nossa cidade?

Simplício na peça teatral “Pluft, o fantasminha”

Especialista na área, decidido a mudar o rumo nos estudos de nossa história, colaborou na criação do SEPEDOC – Setor de Pesquisa e Documentação do Departamento de Educação e Cultura, embrião do Museu de Antropologia do Vale do Paraíba.

Participante de movimentos sociais e políticos em nossa região, além de procurar direcionar as reivindicações da classe do professorado, foi um dos precursores do Movimento da Comunidade Negra de Jacareí, sempre orientando e assessorando a iniciativa, procurando minimizar ou erradicar os preconceitos raciais. Assim, passou a proferir palestras, tornando possível o surgimento do Projeto de Cooperativa Educacional que buscava valorizar a raça negra e criar condições de ingresso em faculdades federais, não só de alunos negros, mas também daqueles carentes financeiramente.

José Simplício amava o que fazia e deixou-nos uma lição de cidadania e humanismo. Era um professor no sentido exato da palavra, tanto que, mesmo aposentado, não se afastou daquilo que sempre deu sentido a sua vida, continuando a proferir gratuitamente aulas particulares aos menos favorecidos e cuidando voluntariamente da biblioteca do Silva Prado.

Hospitalizado em Guarulhos, nosso mestre nos deixou em 13 de junho de 2000, aos 71 anos. No entanto, enquanto nos lembrarmos daquele professor que alegremente viajava pela história, ele certamente continuará fazendo parte de nossas vidas.

Escola Estadual “Prof. José Simplício” no Campo Grande

 

 

Fonte: Família Simplício

 

5 Replies to “José Simplício”

  1. Oi Fernando, que texto lindo. Quanto amor tem em suas palvras. A familia Simplicio ageadece de todo coracao o seu carinho e o carinho de todos os jacarienses. Gratidao!!!!

  2. Foi meu professor de História no CENE na antiga 5 e 6 séries do ginásio nos anos de 1975 1976 Professor Silplicio como o chamávamos um dos melhores que tive em minha vida , quando começou na 5 série contava estórias da história lembro até hoje , lembranças da minha juventude que tragou até hoje, estou em vias de me aposentar como Eng. ELETRICO, ENG. SEG.DO TRABAKHO E POS EM GESTAO PROJETOS ….estudei muito mas tem boas lembranças do CENE e do Professor SINPLICIO que Deus o tenha.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *